GT ODS - Entrevista com o Prof. Laerte Sodré Jr.

Grupo de Trabalho para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) do IAG entrevista o Prof. Dr. Laerte Sodré Jr.

Laerte Sodré Junior
Laerte Sodré Junior é Professor Titular do Departamento de Astronomia do IAG-USP.

Laerte Sodré é formado pelo Instituto de Física da USP, com mestrado e doutorado realizados no IAG, e pós‐doutorado no Royal Greenwich Observatory em Cambridge, Inglaterra. Atualmente, é professor do departamento de Astronomia e tem como tema de pesquisa as estruturas em grandes escalas. O professor Laerte assumiu a coordenação do projeto “Explorando o universo: da formação de galáxias aos planetas tipo‐Terra, com o Telescópio Gigante Magellan” (Projeto GMT‐FAPESP) em 2020. Esse projeto visa contribuir no desenvolvimento de instrumentação do telescópio gigante Magellan (GMT – Giant Magellan Telescope), que está sendo construído em Las Campanas, no Chile.

O GMT é um dos três grandes projetos da nova geração de telescópios gigantes que possibilitará um salto de qualidade com relação às observações do solo, alcançando alvos muito mais fracos. Com ele, será possível estudar as primeiras galáxias e estruturas na época da reionização, uma fase importante no início do universo. Esses avanços serão viabilizados pelas tecnologias de ponta associadas ao GMT. Professor Laerte trabalhou em outros projetos de instrumentação bem sucedidos, como o PSF (Prime Focus Spectrograph), espectrógrafo do telescópio Subaru, localizado no Havaí. As observações com o PSF devem começar no início do próximo ano.

“A primeira ideia desse projeto [PSF] é do ano 2000. Então, você imagina quanto tempo demora para um projeto de instrumentação maturar e ser concluído: são décadas.”

Além das oportunidades científicas de fazer parte do GMT, o Projeto GMT‐FAPESP desenvolve um grupo capaz de fazer instrumentação científica de ponta no IAG. O grupo de instrumentação astronômica no instituto é uma ideia desde os anos 70, mas nunca foi fácil consolidá‐lo.

“A gente está sendo extremamente bem‐sucedido com isso no GMT. Porque nós, praticamente, participamos de quase todos os  projetos de instrumentos. A parte de engenharia de sistemas do GMT está sob nossa responsabilidade.”
“[...] Temos vários desafios grandes pela frente. O principal deles é como manter esse grupo de instrumentação, considerando que o GMT só vai estar em operação daqui a uns 10 anos [...], mas eu acho que a gente tem condições de superar.”

GMT
Telescópio Gigante de Magalhães (GMT).
Créditos: GMTO.
 

Relação com os ODSs
Projetos de grande magnitude, como o GMT, inevitavelmente estão inseridos em diferentes temas nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Destacamos:

ODS 4 ‐ Educação de qualidade

“A Astronomia toca de forma tangencial [nos ODSs], mas eu acho que pode trazer uma grande contribuição na parte de educação”.

No IAG, contamos com inúmeros projetos de extensão voltados para a educação para pessoas de todas as idades, como o Astronomia para Todos e o Astronomia para a Terceira Idade. O programa de treinamento de professores e as séries de divulgação produzidas no Projeto GMT  também visam esse objetivo.

Os cursos de Astronomia para docentes do ensino médio promovidos anualmente são muito procurados. As aulas são virtuais e as vagas podem ser pleiteadas por professores de todo o país. A série de divulgação científica Fascínio do Universo, lançada em 2020, já conta com duas temporadas. Agora, em 2024, uma nova série está sendo produzida com foco em instrumentação, intitulada Mirando as Estrelas.

“A ideia é fazer difusão científica usando instrumentação para as pessoas saberem mais sobre como são os equipamentos e quão complexos eles são.”

O professor comenta como a Astronomia pode ser uma excelente ferramenta para a aumentar a alfabetização científica, por ser um tema muito atraente para o público geral.

“[A alfabetização científica] cada vez mais é um desafio em um mundo em que a anticiência tende a proliferar [...] e é papel nosso, dos cientistas, lutar contra isso. A melhor forma de lutar é mostrar a beleza da ciência e a importância que a ciência tem para a vida das pessoas.”

ODS 9 ‐ Indústria, inovação e infraestrutura

A Astronomia e a Física se destacam com suas contribuições para o desenvolvimento de novas tecnologias.

“Quando a gente fala de desenvolver instrumentação astronômica, não é ir numa loja, comprar as peças e montar.”

O grupo de instrumentação do IAG concluiu recentemente uma atualização no sistema de óptica adaptativa do SOAR (Southern Astrophysical Research Telescope), situado no Chile. Sistemas de óptica adaptativa são utilizados para corrigir distorções nas ondas eletromagnéticas causadas pela atmosfera, mas não se limitam à Astronomia. Essa tecnologia possui aplicações militares e, portanto, não é de fácil acesso e precisou ser desenvolvida desde o começo pelo grupo. O desenvolvimento do equipamento para o SOAR foi realizado como parte do Projeto GMT‐FAPESP e
desempenhou um papel crucial na aquisição do conhecimento necessário para o grupo avançar no projeto de óptica adaptativa para o GMT.

ODS 12 ‐ Vida terrestre
A União Astronômica Internacional tem o projeto Dark and Quiet Skies. Trata‐se de um protocolo para promover a preservação do céu noturno em todos os sítios onde os telescópios estão instalados.

A poluição luminosa é um grande problema para a Astronomia, reduzindo o número de estrelas que podem ser vistas a olho nu e também afetando a quantidade de fótons recebida nas observações.

“[...] a gente prejudica a observação do céu e [...] as pessoas acabam esquecendo que ele existe. Ninguém fica olhando para o céu de noite nas nossas cidades. As pessoas ignoram que ele existe, enquanto no passado certamente a presença do céu noturno era algo determinante na vida das sociedades.”

No entanto, os astrônomos não são os únicos atingidos. A iluminação artificial também prejudica os animais que se orientam por meio da luz da Lua e das estrelas, como insetos e pássaros migratórios. Diversas atividades de divulgação para conscientização do público geral são realizadas pelos observatórios, assim como documentos com recomendações para a instalação de postes. Um exemplo é o guia elaborado pelo McDonald Observatory.

Além da importância científica e de preservação da natureza, a adaptação da luz artificial com sistemas menos poluentes também representa um consumo de energia mais eficiente. Redirecionando os fótons que seriam lançados para o céu, é possível obter uma melhor iluminação
dos espaços que não implica em um maior custo.


“No Chile, isso é até política de estado. O Chile valoriza muito o seu céu noturno, porque reconhece que é um asset que eles têm e que eles precisam preservar.”

A luz visível não é a única onda eletromagnética que prejudica as observações e, por isso, manter o céu quieto também é uma preocupação. As novas tecnologias progressivamente ocupam frequências que antes estavam restritas às observações de radioastronomia. Sendo assim, faz‐se necessário implementar políticas para proteger as áreas onde estão localizados radiotelescópios. As restrições em Atibaia, no interior de São Paulo, onde foi construído o Rádio‐Observatório de Itapetinga, podem ser encontradas no site oficial.

Mais informações sobre o projeto estão disponíveis no site GMT Brasil.

 

Escrito por: Fabricia Oliveira Barbosa, Mestre em Astronomia e estudante de Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Astronomia do IAG-USP e participante do Grupo de Trabalho para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no IAG-USP.

Revisado por: Luanah Santos, Secretária do Departamento de Geofísica e participante do Grupo de Trabalho para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no IAG-USP.